
Cuidados
de uma doula
Marisa era médica veterinária. Em sua segunda gestação, um parto natural a fez mudar a forma de ver o mundo e de profissão. Há três anos deixou o cuidado com animais para cuidar de gestantes que, assim como ela, querem ter um parto tranquilo, acima de tudo. Agora Marisa é doula e faz questão de propagar os benefícios dessa profissão para todas as futuras mães. “Com o nascimento da minha segunda filha, um parto natural, diferente do meu primeiro, que teve intervenções desnecessárias e algumas situações de violência obstétrica, eu me sensibilizei pela causa e comecei a trabalhar como doula”.
Para quem não se familiariza com o termo, doula é uma assistente de parto que acompanha toda a gestação de uma mulher, podendo estender esse acompanhamento até o pós-parto.“Eu trabalho acompanhando a mulher desde a gestação, dando informações sobre o parto, ajudando na escolha desde o que ela quer para seu parto até que tipo de equipe ela quer que acompanhe nesse dia”.
Marisa conta que já viu e ouviu muitos casos de violência obstétrica. Comentários como “ah, vai gritar agora, mas pra fazer não reclamou”, “vai ficar toda larga”, “vai acabar o parquinho do marido”, assim como outras posturas extremamente antipáticas e violentas fazem parte de situações reais enfrentadas por mães que a doula conhece. Marisa descreve: “Eu era fotógrafa de parto e vi um caso de extrema violência física e verbal. É muito ruim até para quem está assistindo. Foi muito ruim. Eu ainda não era doula e fiquei chocada, extremamente sensibilizada. É horrorizante”.
O apoio de uma doula não é tão essencial, afirma Marisa, mas faz a diferença. Esse cuidado a mais é prazeroso, modificando as cenas de um parto. A doula tem o papel de fortalecer os vínculos da mãe com o bebê, da mãe com o marido. Confiante, a mulher que passa pelo trabalho de parto sente alívios físicos originados no amparo, na assistência que é determinante para o sucesso. “A mãe se sente muito mais acolhida, muito mais liberta de mitos ou traumas, confortada, acarinhada e apoiada”.
Relembrar o parto como algo traumatizante é o que faz Marisa se empenhar na luta contra a violência obstétrica. “Tudo que não respeita o desejo da mulher e que poderia ser feito de forma diferente é uma forma de violência”. Para disseminar a informação, ela reúne centenas de mães em uma rede de apoio organizada por meio de um aplicativo de mensagens. “Temos a rede de apoio há dois anos e muitas mães fazem amizade além do grupo. Temos reuniões mensais e essa rede ajuda a prevenir a depressão pós-parto, ajudando na força, no apoio psicológico”. Marisa realiza periodicamente cursos gratuitos para gestantes acompanhadas pelo SUS, mulheres que não têm disponibilidade econômica para contratar uma doula. "Essa preparação é muito importante. Mesmo sem o meu acompanhamento, elas saberão como ter um parto benéfico”, acrescenta.
E mesmo com a informação, Marisa não deixa de ressaltar o valor da denúncia. Ela insiste na importância de não desistir por se sentir fragilizada ou por medo da exposição. “A culpa nunca é da vítima. Nesse caso, a culpa não é da mulher, não foi ela quem escolheu passar por isso. O parto deve ser um evento prazeroso, feliz, saudável, familiar. Deve ser um momento de transformação psicológica, de fortalecimento, de empoderamento feminino, e nunca um momento violento”.
É necessário conversar com grupos de apoio, com outras vítimas e outras mulheres, recomenda Marisa. Isso dissemina a empatia. Não é preciso ter vergonha de conversar sobre o assunto. Muitas coisas só mudam quando existem denúncias, quando a informação é compartilhada. E esse é um dos casos.
